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sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

EDITORIAL

São Paulo, 21/2/2008 Dojival Vieira Jornalista Responsável ( www.afropress.com.br)

Lula, o pai dos Negros, na Casa Grande chamada Brasil
Quem esteve na posse do novo ministro da Igualdade Racial, Edson Santos, e manteve “a cabeça reta e a espinha ereta”, no dizer do poeta Walter Franco, pôde constatar in loco, em pleno Palácio do Planalto (mais in loco, impossível) como opera a lógica do Poder no Brasil – e, em especial, neste Governo – em relação a nós, os 49,5% da população auto-declarados pretos e pardos, vale dizer: negros.
Se não, caro (a) leitor (a) responda:
a) em que outra cerimônia de posse de um ministro, o Presidente da República se sentiria à vontade para atropelar o cerimonial, falar primeiro, e depois se retirar, levando consigo toda a mesa, alegando outros compromissos de agenda?
b) em que outra cerimônia de posse de um ministro, o Presidente da República anunciaria, com certa solenidade, a criação de um Ministério – arrancando urros de uma platéia negra enlevada - para, uma hora depois, se desmentir em nota da própria Secretaria de Imprensa da Presidência da República?
Na verdade, resume a nota, não era nada daquilo que provocou tanto alvoroço na platéia enlevada e manifestações de tietagem explícita: para driblar uma imposição legal, ou seja, deputados não podem ser titulares de Secretarias Especiais da Presidência sem renunciar os seus respectivos mandatos, Lula simplesmente “ministerializou” o ministro por meio de uma Medida Provisória.
Vale dizer: transformou Santos em ministro de direito, já que titulares de Secretarias Especiais têm apenas o status do atributo pomposo.O detalhe é que Lula sabia disso, pois assinou o texto da MP pouco antes, como anunciou ao abrir a solenidade.
Por que preferiu a recaída ao palanque, a ponto dos enlevados até repetirem o jingle de 2002 (aquele, olé, olé, olé, olá, Lula, Lula!!!) é mistério de difícil elucidação, a não ser que o enlevo da platéia tenha provocado no Presidente súbitas saudades de 20002.
Aliás, o discurso de Lula merece análise, mas não de lingüistas, já que a retórica casual/porta de fábrica é conhecida de qualquer ativista com mais de 30 anos, mas de psicanalistas. Quase sempre quando fala para Negros, Lula mostra-se mais à vontade do que de costume: ele sabe usar como ninguém a figura do pai – metáfora que passou a frequentar seus pronunciamentos desde que chegou ao Planalto, assim como o uso de imagens futebolísticas.
Com os Negros, o “pai” assume, com maior naturalidade, sua autoridade, a ponto de filosofar, repetir platitudes e se sentir à vontade para distribuir uma enxurrada de conselhos. "O projeto de Lei (do Estatuto) está lá (na Câmara) há muito tempo. Enquanto vocês estiverem brigando ele ficará mofando lá", ensinou Lula. “Vocês tem de reivindicar, de cobrar, porque nós temos a tendência a nos acomodar a nossa agenda cotidiana. Como vocês tem uma dívida de séculos tem o direito de reivindicar muito mais”, acrescentou. “Enquanto vocês não se puserem de acordo, esse Estatuto não será votado”, continuou, no tom paternal de sempre.
No caso da exoneração da ex-ministra Matilde Ribeiro, Lula falou como se não fosse ele próprio o responsável pela exoneração. Matilde continua “intocada”, não cometeu nenhum delito, apenas falhas administrativas, discursou Lula, para delírio da platéia enlevada.
Ora, se a ex-ministra não cometeu mais do que “falhas administrativas" corriqueiras – o que, presume-se, faça parte do cotidiano de qualquer Governo ou Administração – porque até agora Matilde foi a única a ter a cabeça entregue numa bandeja no escândalo dos gastos excessivos com cartões corporativos?
A pergunta é: se não cometeu crime ou delito, e mesmo assim seu chefe – vale dizer, o próprio Presidente – a demitiu, estamos diante da confissão de um desvio: Lula pune com exoneração e direito à execração pública, até mesmo auxiliares inocentes, é a conclusão óbvia e inescapável.
Se não, a declaração deveria ser seguida do anúncio da imediata recondução ao cargo, seguida de desculpas públicas pelos transtornos e constrangimentos.
Mas, é no capítulo dos conselhos que Lula se excede como pai e deixa evidente o jogo de sedução/manipulação do qual abusa quando tem diante de si uma platéia de Negros.
Como todo pai, Lula nos trata como pais tratam filhos ainda incapazes de responder por si, assumir suas responsabilidades - um misto de paciência e compreensão com a incapacidade do filho de fazer frente a certos problemas, que é freqüentemente o centro do discurso paterno,
mas o faz, abusando da sedução de quem é íntimo para não provocar rebeldias indesejáveis.
Não fôsse este o objetivo como se pode explicar que um Governo que tem ampla maioria na Câmara dos Deputados, a ponto de aprovar o que bem entender, pretenda agora jogar em nossas costas, a culpa pela não aprovação de um instrumento jurídico como o Estatuto da Igualdade Racial – uma Lei que está atrasada há pelo menos 120 anos?
Um Governo que pode quase tudo, como uma Câmara dócil e com larga maioria, como pode pretender colocar como condição, o que sabe ser praticamente impossível - a união das várias correntes do Movimento Negro que, neste caso, se divide profundamente: desde os que pretendem a retirada do projeto, até os que assistem passivamente o debate, contentando-se em dizer que são favoráveis ao Estatuto como se fosse possível aprová-lo por inércia?
Ora, se este Governo, verdadeiramente quisesse aprovar o Estatuto, bastaria mobilizar sua base para isso e o Estatuto seria aprovado, com folga. Não ficaria fazendo esse jogo de esconde/esconde, nem tergiversando sobre o tema como faz o Presidente.
No caso do anúncio da transformação da Seppir em Ministério, mais uma vez, é impossível não lembrar uma imagem muito recorrente na relação entre pais e filhos: o Presidente/pai deu o doce, o filhinho comemorou feliz da vida, para, logo em seguida (menos de uma hora depois), o pai arrepender-se e retirar o doce das mãos, antes que começasse a ser degustado.
Responda, mais uma vez, caro (a) leitor (a):
Essa associação é ou não é pertinente?
O Presidente Lula, a continuar tratando os Negros e a questão racial da forma como o fez na posse do novo ministro, reproduzindo a velha tática da elite racista de nos conceder apenas a condição de “símbolos”, terá criado a mais eficiente estratégia de manutenção do racismo no Brasil: a estratégia que reconhece a existência da discriminação deblatera e a condena, porém, não dá conteúdo nem conseqüência ao que constata.
A reação da platéia enlevada é que não deixa de ser patética e acaba reforçando no pai, exatamente o efeito pretendido: crianças devem ser tratadas como crianças.
Desta forma, não há como não lembrar: assim como Getúlio entrou para o folclore político como “o pai dos pobres e a mãe dos ricos”, Lula tem grandes chances de entrar para a história como “o pai dos negros e mãe dos donos Casa Grande” – a imensa Casa Grande chamada Brasil. (Fonte www.afropress.com.br)

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